30 de maio de 2012

Infância Roubada


“Os fins não justificam os meios”, quem nunca fez uso deste dito popular? Eu mesma o utilizei na semana passada numa conversa com meus pais, apesar de considerá-lo um tanto confuso e inaplicável a qualquer ocasião. Por exemplo, não sabemos com qual finalidade a Xuxa revelou ter sofrido abuso sexual até os treze anos, há quem diga que foi jogada de marketing ou quem tenha se compadecido do sofrimento dela, mas a realidade é que sua iniciativa foi encorajadora, após seu depoimento o número de denúncias a esse tipo de violência aumentou 30%, em apenas dois dias foram contabilizados 285.000 chamados ao serviço de denúncias. Talvez o intuito não fosse esse e ela sequer imaginasse que teria tanta repercussão, mas os números, por si só, já justificam sua ação, confirmando a minha teoria de que o dito popular não pode ser aplicado em qualquer situação.
Confesso ter feito críticas à rainha dos baixinhos sem ao menos ter assistido à entrevista, considerei desnecessária e apelativa, no entanto, fui surpreendida nesta semana por uma excelente matéria publicada pela revista Veja abordando o tema (violência sexual infantil) e me senti na obrigação de reparar o meu erro compartilhando com você os números alarmantes divulgados pela revista.
Como todos sabemos, as estatísticas são menores que a realidade, mas calcula-se que aproximadamente 20% das crianças sofram abuso sexual no mundo. Aqui no Brasil a estimativa é de que 65% delas são meninas, geralmente com idade entre 6 e 10 anos.
O caso mundialmente conhecido de Jaycee Dugard, seqüestrada aos 11 anos de idade, mantida em cativeiro por 18 (isso mesmo, 18 ANOS), sendo estuprada e gerando duas filhas de um estranho (*mais informações sobre o livro de memórias de Jaycee, Vida Roubada, no final deste post), faz parte de apenas 3% da estatística. Em 97% dos casos o agressor é de convívio familiar, sendo 38% o próprio pai; 29% o padrasto; irmão, avô, tio, primo, amigo da família e até mesmo professor, estão entre os 33% restantes.
Na maioria dos casos, quando não é revelado pela própria criança, o agressor dificilmente é identificado por não ter um comportamento criminoso, apesar da predileção sexual por crianças, pode levar uma vida paralela aparentemente comum. A dificuldade de se relacionar com pessoas de sua idade e a sensação de poder sobre uma criança,faz com que ele a deseje de forma compulsiva, incapaz de ser controlada, fazendo com que se convença de que a criança é conivente com a situação, logo ele não está agindo de forma errada.
Lidar com esse tipo de atitude vai além do entendimento e maturidade de uma criança, ela dificilmente conseguirá colocar em palavras a situação, porém 77% delas dão claros sinais de trauma, seja através de desenhos com figuras mutiladas ou com órgãos sexuais à mostra ou em atitudes de isolamento, comportamento erotizado, distúrbios alimentares, queda de rendimento escolar, entre outros.
Nos Estados Unidos os métodos de abordagem às crianças e as providências tomadas para impedir que a agressão continue e o agressor seja punido são avançados. Eles possuem mais de mil salas especias com brinquedos, psicólogos capacitados, câmeras e microfones para fazer com que a criança conte sua história. Ao mínimo sinal de abuso o menor é afastado do agressor e, caso a mãe seja conivente, a criança é inserida em outra família, após análise psicológica. Esse tipo de agressor passa a ser acompanhado, passando por visitas e entrevistas e caso apresente um comportamento inadequado ele pode ser levado ao isolamento. Em caso de lesões cerebrais ou algum problema genético geralmente são encaminhados a prisões de segurança máxima e cumprem pena em celas individuais. Casos com menores distúrbios são tratados em hospitais psiquiátricos com terapias especializadas e remédios para reabilitação. Exames periódicos são realizados para analisar se o indivíduo pode ser liberado e caso não apresente nenhuma melhora permanecerá sob tratamento por tempo indeterminado. Em muitas situações de estupro e abuso infantil os americanos recorrem à castração química para que não haja mais possibilidade de reincidência.
Já no Brasil a realidade é bem diferente, apesar de possuirmos o Estatuto da Criança e do Adolescentes desde 1990, as medidas para se coibir esse tipo de crime caminham a passos bem lentos. Possuímos apenas 43 salas especias, sem profissionais capacitados. E só! Não há pena específica para esses crimes, nem acompanhamento psicológico à criança, muito menos isolamento e tratamento psiquiátrico ao agressor. 
Além de Xuxa, famosos como Claudia Jimenez (atriz), Joanna Maranhão (nadadora) e Aguinaldo Silva (autor de novelas) revelaram seus dramas incentivando outras vítimas a denunciar seus agressores. Talvez através dessas manifestações será possível aumentar as chances e a esperança de se mudar essa cruel realidade.

Fontes:
Revista Veja - Edição 2271- 30 de maio de 2012
Revista Mundo Estranho - Edição de colecionador- 10 melhores capas
Livro Vida Roubada - Jaycee Dugard



*Vida Roubada – Jaycee Dugard
Não dediquei um post apenas para comentário desse livro por inúmeros motivos, não gostei, não recomendo, não me conformo com a falta de atitude da autora, gerou uma baita discussão com as meninas (Polly e Cris) e ficou conhecido como livro da discórdia já que nós NUNCA brigamos, entre outros, mas como o tema está sendo abordado aqui, a citação dele é válida.
Apesar de ser uma situação extremamente triste o desenrolar da história é muito, MUITO estranho.
Jaycee foi seqüestrada aos onze anos no caminho da escola e mantida em cativeiro por dezoito anos. O cativeiro era a própria casa do seqüestrador e, a princípio, ela ficava trancada num quartinho nos fundos. Os estupros começaram algumas semanas depois, com o consentimento da esposa do psicopata. Três anos depois veio a primeira filha e ela passou a receber liberação para ir até o jardim. Os estupros continuaram e mais alguns anos depois veio a segunda filha e com ela um pouco mais de liberdade, podendo sair até na rua. Nesse meio tempo ela tinha contato com membros da família de Phillip (o cretino), mas nunca esboçou qualquer sentimento de desespero, na verdade não me lembro nem “quem ela era” para a família. Phillip já havia sido preso anteriormente pelo mesmo crime e estava em liberdade condicional, logo os agentes da condicional visitavam sua casa e o que ela fazia? NADA. Nas oportunidades que teve de sair na rua e até mesmo fazer alguns passeios, o que foi que ela fez? NADA. Até mesmo quando a polícia descobriu que ela não era quem dizia ser (eles mudaram o nome dela para Alissa, escolha dela mesma), qual foi a atitude dela? Não falar a verdade, defender Phillip e Nancy (a esposa do mal). Diante de muita insistência da polícia ela conseguiu escrever seu nome verdadeiro num papel e o martírio chegou ao fim.
Em diversos momentos do livro podemos perceber que ela cria uma certa afeição pelo casal, os sentimentos de ódio e respeito são mesclados o tempo todo. A preocupação de causar uma boa impressão a Nancy e Phillip é constante, mas não na esperança de ser libertada e sim para que pudessem viver em paz. Que porra de bruxaria é essa eu não sei, vai muito além da minha capacidade de compreensão, mas não posso negar que a história chocante, triste, injustificável e não recomendável.



2 comentários:

  1. O livro da discórdia... sério, esse assunto me faz muito mal, um dia ainda quero entender o pq, mas me deixa de um jeito que não da nem pra explicar, incomoda na alma...
    Isso só mostra o quanto o ser humano é baixo, é pequeno, é irracional e nojento, animais não fazem isso, somente monstros...

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  2. Tenso... Fiquei mal com essa história toda também!

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